Do
fato de Jesus ter sido contemporâneo dos sectários judeus, dos terapeutas,
também Ele, por conveniência, foi considerado um terapeuta, pois do grego, vem
“therapeutai”, formado por “therapeueim”, servir, cuidar, isto é, servidor de
Deus e curador esotérico, tal qual era Jesus, mas Ele não era um sectário.
Estes sectários eram estabelecidos principalmente em Alexandria, no Egito.
Tinham
muita relação com os Essênios, cujos princípios adotavam também, aplicando,
como estes últimos, a prática de todas as virtudes. Eram de extrema frugalidade
na alimentação, observavam o jejum, celibatários e voltados à contemplação,
viviam vidas solitárias. Eram reencarnacionistas e se constituíam como uma
verdadeira ordem religiosa.
João,
o Batista, o precursor, era considerado pelos Essênios como um grande espírito,
uma reencarnação de um “Grande Profeta Bíblico” e dos Essênios assumiu a
prática da ablução dos pecados com a água, prática perpetuada pelo cristianismo
em geral e pelos muçulmanos até hoje. Filón, o filósofo platônico de
Alexandria, foi o primeiro a falar dos terapeutas, considerando-os uma seita do
judaísmo e Eusébio, São Gerônimo e outros pais da igreja, pensaram que eles
eram cristãos. Mas é evidente hoje, que do mesmo modo que os Essênios, os
terapeutas representam o traço de ligação com o catolicismo só pelo batismo,
pois este não é reencarnacionista.
Pelo
fato de Jesus ter conhecido a seita dos terapeutas, seria errôneo concluir-se
que a Sua doutrina fora haurida dessa seita e que, se tivesse vivido em outros
meios, teria professado outros princípios. Sustenta-se esta teoria pelo fato de
Jesus não ter deixado escritos, porém toda documentação recolhida em volta de
Sua obra, inclusive dos apóstolos, foi perdida no incêndio da biblioteca
palatina em Roma, acontecido logo após o segundo concílio da igreja de
Constantinopla, em torno do ano 553, oportunidade em que foi decretado
definitivamente herético o conceito da reencarnação.
Pois
assim colocava-se a palavra final numa questão de mudanças, começadas nos
tempos de Constantino em 325, e que seria sancionada com a pena de morte quando
houvesse a sua contestação, como foi decidido logo depois pela igreja nascente
em 382. Tornou-se definitivamente legal em 1231, porém até lá muita gente já
havia sido queimada ao manifestar-se contra, sendo este fato considerado
heresia. A partir destes fatos, não havia mais “Velho e Novo Testamento”.
Afirma o Apóstolo João, na Sua
participação no livro medianímico, recebido na França por volta de 1830,
considerado pelos entendidos, a “Terceira Revelação”, que conhecemos hoje com o
título português de “Vida de Jesus ditada por Ele mesmo”, que depois para
substituir os documentos perdidos, foi encomendada a um grego a elaboração de
toda a história que no decurso do tempo veio a ser contida na Bíblia. Um
gentio, que nada teria a ver com o Apóstolo Lucas, mas que mexeu na história
como se fosse o Apóstolo, e diz ainda de Mateus, que muita coisa creditada
também a ele também não seria dele.
Nisso
provocou-se uma grande confusão em que o homem se perdeu. Na realidade, esta
história foi um capítulo da Humanidade que até hoje não se compreendeu bem, mas
depois das ambiguidades da igreja sobre o espírito, um dos primeiros exemplos
das variações provocadas pela obra de Constantino, podia ser visto numa porta
de duas almofadas esculpidas em Roma, na igreja de Santa Sabina, no fim do terceiro
século, uma das primeiras igrejas. Nas almofadas encontram-se cenas do velho e
novo testamento que podem ser lidas simultaneamente.
O
trabalho tem de um lado os três milagres atribuídos a Moisés: o adoçamento das
águas do Mara, a provisão de maná durante a fuga do Egito e a retirada de água
de um rochedo. No outro, estão três dos milagres do Cristo: a restauração da
visão de um cego, a multiplicação dos pães e dos peixes e a transformação da
água em vinho no casamento de Canaã. Sem considerar que Jesus, na “Terceira
Revelação”, desmente e credita estes fatos ao fervor do Apóstolo João, que via
milagres em tudo. Mas
o que teria lido um cristão, olhando as portas da Santa Sabina, na metade do
século IV? A árvore com que Moisés adoçou as águas amargas seria reconhecida
como a cruz. A fonte, tal como Cristo, uma fonte de água viva dando vida ao
rebanho cristão.
O
rochedo do deserto em que
Moisés foi bater, também seria lido como a imagem de Cristo,
o Salvador, de cujo flanco escorria o sangue e a água. O maná preanunciando o
alimento de Canaã e da “Última Ceia” e assim foi reduzida a doutrina de Jesus,
a uma fábula mal contada que veio integrar-se a ela. Evidentemente, não era
isso que São Nilo, o autor da Bíblia figurada tinha em mente, mas a sua primeira
visão teria se tornado herética e definitivamente punível depois do segundo
concílio da igreja.
Essas
“Bíblias” eram grandes livros de figuras em cujas páginas havia duas ou mais
cenas. Preso a um atril, o livro veio a ser chamado de “Bíblia pauperum” quando
veio a ser estampado depois por Heidelberg, no século XIV, que expunha suas
imagens, dia após dia, mês após mês, em sequência e poucos aprenderiam os
vários sentidos de cada imagem, em seu significado histórico, moral e
alegórico. Mas era o livro dos pobres que não sabiam ler e que em torno das
figuras, enfeitavam as narrativas sagradas, ouvidas dos padres. A Bíblia
figurada de São Nilo inspirou os livros das missas e vitrais das igrejas, mas
foi necessário muito trabalho para reconstruir aquilo que os autores fizeram
aí, a partir do ano 325.
Do livro: O EVANGELHO SEGUNDO A LITÁURICA