Segundo a tradição, na véspera da Batalha de Ponte
Mílvio, Constantino teve uma visão (ou talvez um sonho profético), durante a
qual recebeu um brasão milagroso e a ordem celeste de reproduzi-lo nos escudos,
para obter a vitória. Esse brasão, dependendo da fonte, poderia ser um "X
ao contrário, com as pontas dobradas" ou as iniciais gregas do nome de
Cristo, x (chi) e p (ro), entrecruzadas.
Muitos historiadores colocaram em dúvida ou
redimensionaram a veracidade do episódio. Talvez os soldados de Constantino,
provenientes da Gália, usassem um símbolo solar no escudo, que poderia ser
confundido com a cruz cristã; ou Constantino pode ter mandado gravar o
monograma apenas para distinguir suas tropas das de Magêncio.
Com certeza, Constantino, na época, já travara
contato com ambientes cristãos. Por exemplo, o bispo Osio, de Córdoba, já fazia
parte de seu séquito.
É possível imaginar que Constantino tenha
aproveitado a ocasião para testar a eficácia da nova religião e, tendo visto
que funcionava decidido adotá-la, transformando o Deus dos cristãos em seu
protetor pessoal.
Em seguida, Constantino concedeu crescentes favores,
financiamentos e reconhecimentos ao culto cristão. Os bispos, por exemplo,
foram isentos do pagamento dos impostos, tornaram-se funcionários imperiais e
até juízes de apelação. Em troca, obteve uma ingerência cada vez
maior nos assuntos internos da Igreja, da qual se considerava "bispo
externo".
Ao mesmo tempo, ele assegurou por muitos anos, pelo
menos aparentemente, a prática dos tradicionais cultos romanos: assumiu o
encargo de "Pontífice Máximo", ou seja, grande sacerdote do culto
politeísta romano; aceitou a realização de jogos e sacrifícios aos deuses em
sua homenagem; mandou cunhar moedas com a imagem do Sol Invictus, o Sol
Invicto; e tornou feriado o Dies Solis, o Dia do Sol, nosso
"domingo". O Sol Invicto era uma divindade adorada por muitos povos
do Império e pelo próprio Constantino, antes da conversão. Ao
mesmo tempo, entretanto, a esfera solar podia ser considerada um símbolo do
Deus dos cristãos e de outras religiões monoteístas do Império.
Outro sinal do empenho de Constantino foi a
promulgação de leis morais muito rígidas. Um exemplo é a seguinte, emanada em
320.
O homem que tomar uma moça, com ou sem seu
consentimento, sem antes ter estabelecido um acordo com seus progenitores [...]
não terá na resposta da moça nenhuma vantagem dada pelo direito antigo, e a
própria moça será considerada culpada de cumplicidade no delito. E como muitas
vezes a vigilância dos pais é burlada pelos discursos e comportamentos
cativantes das nutrizes, que sobre elas [...] recaia a ameaça do seguinte
castigo: a abertura de sua boca e de sua garganta, que emitiram sugestões
arrasadoras, será fechada com a ingestão de chumbo derretido. Se for verificado
o consentimento voluntário da virgem, que esta seja punida com a mesma rigidez
que seu raptor, e não será concedida imunidade nem às moças que forem raptadas
contra sua vontade, pois poderiam ter permanecido em casa até o dia do
casamento, e se a porta houver sido arrombada pela audácia do raptor, estas
poderiam ter pedido ajuda aos vizinhos com seus gritos e se defendido a todo
custo. Mas, para estas moças, cominamos uma pena mais leve e ordenamos que
sejam deserdadas por seus progenitores [...] Se os progenitores, para quem a
vingança pelo crime deveria ser uma preocupação particular, mostrarem
tolerância e reprimirem sua dor, serão castigados com a deportação.
Os historiadores contemporâneos garantem que a
adesão ao cristianismo de Constantino foi convicta e sincera, e é provável que
seja verdade, se levarmos em consideração que as concessões religiosas de um
oficial romano da época eram bem diferentes das nossas: "...a função do
imperador é a de se colocar como sujeito coletivo que represente toda a cidade
e todo o mundo (orbis), na qualidade de Imperator orbis. De fato,
o primeiro encargo que Augusto reserva a si mesmo é o de Pontifex Maximus, representante
junto à divindade que constitui o pacto da aliança [...] E isso continua em
vigor até Constantino. Roma, portanto, através de seus sacerdotes, de seus
institutos, de seus colégios coletivamente representados pelo imperador, pede à
divindade três coisas:
1. A fertilidade das mulheres (tanto mães quanto Mulheres, pois, para os
romanos, havia pouca distinção);
2. A vitória dos exércitos;
3. A paz social.
Em troca, ofereciam o culto às divindades.
O direito penal
romano tem penas atrozes para os transgressores do culto, pois desrespeitar o
culto significava desrespeitar o pacto [...] e a consequência da chama apagada
pela não observância de uma vestal era a infertilidade das mulheres, a derrota
do exército e a desordem social. Esse é o esquema com base em que Roma age da
República até Constantino. Constantino, quando proclama o Edito de Milão,
realiza uma operação muito simples: como os velhos deuses não funcionavam mais,
pensa em substituir o velho Panteão pelo deus dos cristãos, e, ao perceber que
o motor volta a funcionar a pleno vapor e se converte [...] Constantino continua
pagão, ou seja, ligado à mentalidade religiosa clássica, até sua morte."
Texto extraído do livro: O LIVRO NEGRO DO CRISTIANISMO - Dois mil anos
de crimes em nome de Deus - Jacopo Fo, Sérgio Tomat, Laura Malucelli
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