A RESSUREIÇÃO DE JESUS
SEGUNDO O APÓSTOLO PEDRO
A Ressureição de Jesus – O relato de Pedro
Queridos irmãos:
Nosso primeiro impulso ante a morte de Jesus foi de terror e institivamente parecia querermos fugir dentre a multidão (já bastante reduzida pela retirada de muitos), temendo nós as brutalidades de que tínhamos visto fazer gala a esse populacho inculto e feroz.
Em verdade, José de Arimatéia, Alfeu, Marcos e Tomé, na noite terrível que precedeu a crucificação, tinham dado já provas de valor muito superior à minha covarde atitude de negador do Mestre. Em compensação, Tiago e João, que também haviam seguido ao Senhor até à casa do grande Sacerdote, tinham dado eles igualmente provas de fraqueza afastando-se quando lhes pareceu correrem algum perigo, e maior cobardia ainda haviam manifestado os que fugiram desde o primeiro momento. ...viu-se rodeada a cruz pelas santas mulheres que haviam estado acompanhando a Maria, a mãe, a poucos passos do patíbulo, por José de Arimatéia, por Tiago e João, filhos de Zebedeu, Tiago o irmão de Maria, Marcos, Alfeu, e eu, que fomos os primeiros a nos acercarmos dos queridos despojos. Descido imediatamente o corpo do madeiro e confiado por alguns momentos ao cuidado unicamente das mulheres, a fim de que o preparassem para seu enterro, segundo o costume de então, depositou-se no sepulcro de José de Arimatéia.
Uma cousa, no entanto, passara já havia por minha mente. Era ideia imperiosa que me apontava como uma necessidade imprescindível: a de ocultar o cadáver de um modo seguro e com o mais absoluto sigilo, de maneira que nem mesmo os discípulos o soubessem, enquanto não se aplacassem os ódios que a tais extremos haviam chegado. Enfim, para que a segurança fosse completa, absoluto devia ser o segredo e para isso necessário era que permanecesse encerrado em minha consciência somente.
José de Arimatéia também tinha pensado em procurar os meios de precaver toda a possível tentativa de profanação dos queridos despojos.
Efetivamente, passados os efeitos da surpresa e depois de algumas hesitações e breve indecisão, acabamos por explicar-nos mutuamente nossa recíproca situação e combinamos agir de comum acordo. Arimatéia conhecia um sepulcro algo distante e de pobre aspecto, que havia sido abandonado por seus proprietários, os quais tinham desaparecido desde os dias da conquista de Jerusalém... No indicado, pois, por José de Arimatéia, resolvemos depositar o cadáver, pondo mãos a obra imediatamente.
Chegamos ao sepulcro de Arimatéia, levantamos com muita dificuldade a grande pedra que o fechava, fazendo alavanca de nossos bastões. Tiramos ao cadáver o lençol sujo e ensanguentado com que estava envolvido, assim como outro pedaço de pano que rodeava sua cabeça e que também estava todo ensanguentado. Envolvemo-lo em substituição, completamente, com um lençol grande que José de Arimatéia tinha levado. Em seguida, muito agitados, pois havia-nos parecido ouvir passos de pessoas... quantas vezes nos pareceu ouvi-los nessa noite!... carregamos com o corpo e abandonamos o sepulcro, esquecendo-nos de fechá-lo novamente. Grande foi o trabalho que nos custou a condução de nossa preciosa carga por entre a escassa claridade da noite e por caminhos íngremes e tortuosos.
Apenas teria desfrutado um curto sono quando um alvoroço desusado me despertou bruscamente, no mesmo momento em que João e as duas Marias se precipitavam para mim gritando: “Jesus ressuscitou como estava anunciado”. “Eis que, acrescentou João, as mulheres acabam de encontrar o sepulcro aberto e vazio, o lençol que envolvia seu corpo e a toalha que envolvia a cabeça ficaram ali deixados de lado”.
João, por sua parte, insistiu uma vez mais em que Jesus tinha ressuscitado segundo sua própria promessa, porém jamais haviam saído dos lábios do Messias palavras que pudessem aproximar-se a semelhante significado.
João, sim, tinha assegurado entre outras cousas filhas de seu caráter novelesco e exagerado que o Messias ressuscitaria ao terceiro dia de sua morte, porém Jesus nada nos disse que se pudesse parecer com isto.
Tinha-se valido também da palavra ressureição, porém, mais ou menos, desta forma: “Muito breve, depois de minha morte, ressuscitarei nomeio de vós para dar-vos prova evidente de minha presença a vosso lado, porém tende como certo, e não olvideis que, embora invisível, sempre estarei presente a vosso chamado e que toda vez que me recordeis no meio de vós estarei. Ainda que vossos olhos não me vejam, nem me apalpem vossas mãos, me pressentirão vossos corações e me ouvirão vossas consciências porque a carne só pela carne é vista, o espírito pelo espírito”.
...os ensinamentos do Messias se referiam constantemente à influência que os espíritos livres exercem sempre sobre os encarnados e que no estado de espírito é quando o ser tem maior domínio sobre todas as suas faculdades.
Aos seus discípulos, entretanto, tinha por costume explicar-lhes detalhadamente as grandes verdades das vidas sucessivas, da pluralidade de mundos habitados, das verdadeiras formas de justiça divina, do progresso como lei essencial do Universo intelectual, sendo que seus continuados esforços resultavam quase de todo estéreis, pois nós mesmos dispúnhamos de muito curta inteligência e cheios tínhamos nossos espíritos das preocupações mais vulgares do judaísmo popular.
O certo é que, pouco a pouco, à medida que os apóstolos foram convencendo-se que não existia nenhum interesse pelo corpo de Jesus por parte de seus inimigos, perplexos eles próprios, cada vez mais, por seu estranho desaparecimento, e com a afirmação constante de João, foram admitindo tacitamente a possibilidade da ressurreição, possibilidade que terminou por converter-se, finalmente, em um dogma, apesar de, na realidade, isto ter sucedido quando nenhum testemunho existia já desse tempo.
Sobretudo, havia acalmado meu espírito um sonho extraordinário para mim, naqueles momentos. Foi na noite seguinte à nossa façanha, inteiramente justa e inocente por seus fins que, antes de entregar-me ao sono, orei muito, de joelhos, apoiado a uma cadeira. Adormeci, quando, inopinadamente, vi o Mestre descendo do alto do aposento na minha direção. Seu semblante apresentava-se-me carinhoso e risonho, com uma expressão de benevolência realmente angelical. Eu caí de joelhos durante o sonho, dizendo: Senhor, por que me procuras? – Aproximou-se principalmente sem mover as pernas, como se deslizasse perto do chão e levantando as mãos, como para abençoar-me, mostrou as feridas dos cravos, vendo-se também as dos pés. Não temas, Pedro, disse... tão fraca é já tua lembrança do Messias, do teu Senhor?... Senhor! Senhor! Tu sabes quanto te amo, perdoa, pois, minhas fraquezas e ignorância que me fizeram silenciar a respeito de tua ressureição. Ainda vendo-me, dúvidas, Pedro, ainda? Eis-me com minhas feridas ensanguentadas, toca-me, pois, que é meu corpo e acreditarás. Estendi os braços animado pelo convite, para certificar-me da verdade, porém despertou-me um golpe brusco, tendo perdido o equilíbrio por algum movimento durante o sono, indo dar com a boca contra o chão, ainda que com pouca violência, devido a minha posição de joelhos e por estar apoiado a cadeira.
Quanto à visão de Madalena, que a tradição fez chegar até vós, respeitemo-la dentro das intimidades do sentimento; porém ela certamente em nada podia referir-se ao fato da ressureição material.
Desde o princípio não se demonstrou Paulo muito disposto a reconhecer a nossa autoridade e talvez isto foi um bem. Nós, em troca, nunca lhe demos o título de apóstolo e foi um erro de nossa parte, porque não podia ser mais evidente seu apostolado. Reconheciamo-lo, sem dúvida, como o chefe da igreja do Ocidente e mantínhamos boas relações com ele, pareceu-nos que carecia dessa humildade e mansidão ensinadas pelo Mestre e que deviam distinguir os seus apóstolos.
PEDRO
Do livro: VIDA DE JESUS DITADA POR ELE MESMO – Páginas 438 a 450
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