José e Andréa preparavam as humilhações que amarguei mais tarde, referindo lamentáveis episódios de minha infância, referentes aos últimos dias de meu pai e ao abandono de minha mãe.
... A vida humana encerrada nos limites impostos pelo Criador é um descanso em meio do caminho da imortalidade.
... Porquanto eu sou sempre o Messias, filho de Deus, que baixa da luz para amparar tudo o que já amparei, para defender tudo o que já defendi, para combater tudo o que por mim já combatido.
... O espírito liberto das sombras da natureza humana ilumina-se de luz divina, não lhe sendo já possível desviar-se por ignorância nem diminuir-se por temor das crueldades dos espíritos humanos.
... Minha mãe encontrava-se em Jerusalém devido a um chamado de Maria de Magdala. Ela era tomada nesses momentos duma inquebrantável vontade. Negou-se a voltar para Nazareth e me vi obrigado a contemplar até minha morte essa sua tristeza que constituía uma viva censura para meu sacrifício, essa dor que penetrava em minha alma, enfraquecendo-a. Maria de Magdala empregava, ante mim e minha mãe, toda essa energia que pode arrancar-se da paixão e de toda essa doçura e suavidade que nasce da prece.
Maria de Magdala não era estimada somente por minha mãe: todos os meus discípulos e as mulheres vindas da Galiléia a estimavam.
Propus a minha mãe que me acompanhasse a Betânia, para que não oferecesse a meus irmãos um apoio com sua presença, porquanto não dissipava neles o desatinado propósito de seguirem-me.
Depois de nossa última entrevista em Nazareth, minha mãe alimentava um só desejo: salvar-me da morte. A descoberta que ela fez do profundo afeto de Maria proporcionou-lhe uma esperança a qual associou todos os outros recursos pessoais, que considerou úteis para seus fins.
... e minha mãe, minha terna mãe, impregnada das teorias de uma religião imperfeita, não podia, apesar de sua confiança em mim, renunciar a tudo o que havia acreditado e praticado até então.
A liberdade da alma adquire-se por meio da força intelectual do espírito.
... entendo determinar força intelectual do espírito, alimentando-a com o desejo fervoroso de conhecer as origens e imprimindo-lhe o cunho de uma vontade inalterável de avançar sempre e mais.
Se minha mãe houvesse facilitado minha missão com sua fé, irmãos meus, ter-me-ia poupado uma grande amargura durante as lutas de meus últimos dias... Se minha mãe e Maria de Magdala se tivessem associado em toda a plenitude da fé, dentro de minhas crenças, meu espírito ter-se-ia mantido à altura de minha família espiritual, mas pelo contrário a tendência carnal desses dois amores diminuiu minhas forças e preparou minha fraqueza sobre o madeiro do sacrifício.
... O fanatismo, que consiste em uma fé ardente privada da razão, dever ser considerado como uma enfermidade do espírito. A fé verdadeira jamais se separa da razão.
... vós exibis o espírito humano ao desprezo das grandezas universais, porque o espírito humano pratica ou aprova o homicídio.
A família humana ultrapassa todos os erros da razão, quando afirma o direito de morte.
Deus, árbitro soberano dos espíritos, concede-lhes o corpo como instrumento, e o corpo conserva-se mais ou menos tempo, segundo a direção que lhe é impressa pelo espírito e o lugar habitado pelo espírito e pelo corpo.
Vis assassinos, defensores embrutecidos de alguma causa má, defensores sagazes de uma causa incompreensível, heresiarcas realmente convencidos ou valentes apóstolos de uma falsa religião, que julgais verdadeira, todos vós sois mais ou menos culpados diante de Deus e Deus vos julgará.
Justiça dos homens, quando chegarás a ser uma cópia da justiça de Deus?
Irmãos meus, que um homem depravado levante sua mão sacrílega contra uma vida humana, não significa de maneira alguma que uma quantidade de homens tenha o direito de matar o assassino, porque o direito de morte só pertence a Deus e não pode ser um meio para uso das criaturas. Qualquer que seja a forma dada ao assassino, o direito de assassinato não pode existir, porque Deus não pretendeu alterar tacitamente e segundo as circunstâncias, as palavras: Tu não matarás. Conclusão: A aplicação da pena de morte é um insulto ao Criador.
Outra conclusão derivada do mesmo mandamento, tu não matarás, é: A guerra e todos os atos que inundam a Terra de sangue constituem negações do princípio divino e ao mesmo tempo asquerosas saturnais do espírito em delírio...
... Nosso destino, é certo, apoia-se no passado, mas é também incontestável que ele melhora ou se agrava devido às honras ou às vergonhas do espírito e que estas honras e estas vergonhas preparam o porvir.
... Porém, repito, eu podia fugir, e se minha hora estava próxima era porque, querendo elevar-me pelo martírio, via que não era possível alongar a luta.
... Por que os Messias estão destinados a grandes sofrimentos nos mundo inferiores? Porque os Messias trazem verdades e nos mundos dominados pelas tradições da ignorância não podem ser aceitas as verdades senão a força de trabalhos, de humilhações, de lutas heroicas e de longa desesperação, até à morte, quaisquer que sejam as peripécias desta morte.
Regressei a Betânia...
Chegamos à tarde e não obstante a primorosa acolhida de meus discípulos, o abraço efusivo de minha mãe, a emoção das outras mulheres, apercebi-me de um mal-estar geral.
“Mas Simão, exclamei, onde está Simão?” – Marta, inundada de lágrimas, saiu de um aposento contíguo ao que ocupávamos. “Vem, disse ela, pelo menos ele morrerá tranquilo, visto que te chama.”
Maria, minha pobre pequena Maria, atirou-se aos meus braços gritando: “Salva-o, Jesus, salva-o!”
Arredei Marta e Maria e entrei no quarto de Simão. Meu amigo era presa de uma febre ardente, porém tranquilizei imediatamente a todos tornando-me responsável pelo seu restabelecimento. Coloquei-me a seu lado, permanecendo assim durante algumas horas e fiz-me senhor desse delírio, que não anunciava nenhuma lesão mortal. Qualquer outro, conhecedor como eu das ciências médicas, teria obtido o mesmo resultado.
Seis dias depois Simão encontrava-se convalescente e a eficácia da minha cura foi reconhecida com o mesmo entusiasmo que sempre dava a meus atos mais singelos, uma transcendência funesta para minha segurança presente e para minha dignidade de espírito perante a posteridade.
Para celebrar o restabelecimento de Simão, Marta teve a ideia de dar um banquete no qual deviam honrar-me...
Éramos muitos neste banquete. Tomaram parte nele vários parentes, alguns notáveis da povoação, todos os meus discípulos da Galiléia, Marcos, José de Arimatéia, minha mãe, Salomé, Verônica, muitas amigas e companheiras de Marta, formando enfim um total de trinta nove pessoas. Marta, que devia completar o número de quarenta, preferiu, segundo seus desejos ao terminar os preparativos, a honra de servir-me, conjuntamente com Maria de Magdala, Joana, Débora e Fatmé.
Maria, irmã de Simão, permanecia quase constantemente detrás dele, o qual estava sentado a minha frente, no centro da mesa.
... e depois de haver contentado a Simão, ouvi como um soluço a meu lado. Voltei-me e vi Maria. Ela se havia separado de seu irmão para acercar-se de quem havia sido chamado salvador; sua gratidão, seu culto se traduziam em acentos entrecortados, em espasmos da voz, e seu espírito sobre excitado por minhas demonstrações, vinha implorar o apoio de minha força contra a violência de suas ilusões. Tomei a menina em meus braços, sua cabeça inclinou-se e seus cabelos soltos formaram uma moldura de ébano a seu rosto inanimado. Todos os olhares ficaram fixos e os peitos ansiosos, à espera do desenlace de tal crise, cujo termo se anunciou com algumas lagrimas e um fraco rubor da pele. Maria despertou como de um sono, sem compreender a emoção de que havia sido causa, e também com um sentimento de felicidade. Expliquei a Simão a extremada sensibilidade da irmã e indiquei-lhes, com insistência, que não deviam jamais contrariá-la bruscamente em suas excentricidades, a essa alma tão exuberantemente dotada, a esse espírito tão despoticamente governado pela alma.
Do livro: VIDA DE JESUS DITADA POR ELE MESMO – Páginas 245 a 261
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